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Clássicos na Crítica | A Bela e a Fera

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A readaptação com atores do musical A Bela e a Fera, estrelado por Emma Watson, Dan Stevens e Luke Evans, já chegou aos cinemas. Apesar de ser um sucesso de bilheteria, o filme dividiu a opinião da crítica. Porém, uma uma coisa é inegável: ela veio recheada de nostalgia. Nada melhor, então, do que revisitarmos sua versão clássica, uma animação que resiste facilmente o teste do tempo e teve a honra de ser o primeiro longa animado a concorrer ao Oscar® de Melhor Filme: A Bela e a Fera (1991).

A ideia de levar o conto de A Bela e a Fera para os cinemas é antiga. O próprio Walt Disney queria ter realizado esse feito nos anos 1930. Porém, ele sabia que a tecnologia ainda não havia evoluído o bastante para contar uma história tão complexa e engavetou o projeto. Décadas se passaram, até que, nos anos 1980, seu sobrinho Roy, agora presidente dos estúdios, decidiu que era finalmente a hora certa de tentar adaptar o conto de fadas.

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A Pequena Sereia (1989) havia acabado de ser um sucesso, e ele esperava repetir o feito e trazer os estúdios de vez ao seu auge. No entanto, se pensa que a produção da animação foi fácil porque tinha a mão da Disney por trás, vocês está muito enganado. Para começar, o maior foco dos estúdios na época eram filmes com atores ou produtos para televisão e, por isso, desocuparam o belo estúdio de Burbank, na Califórnia, e colocaram os animadores para trabalhar em um barracão.

Os artistas dizem que o ambiente menos formal fez com que eles ficassem ainda mais unidos e se sentissem como uma verdadeira família. E que equipe fantástica! Os três animadores principais eram Glen Keane, Mark Henn e Andreas Deja, um trio de atores com o lápis que foram ideais para o projeto. A animação dos personagens não poderia ser apenas boa, engraçada ou caricata. Para se contar bem a história, os artistas teriam que convencer os espectadores tão bem quanto atores reais o faziam. Caso contrário, seria apenas mais um passatempo para crianças.

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A versão inicial do roteiro do filme era muito mais sombria do que a que conhecemos, e também mais fiel ao conto original. Bela teria irmãs malvadas, assim como Cinderela. E Gaston não seria seu único pretendente. E o mais estranho de tudo, não seria um musical. Por trás dessa versão estava o diretor britânico, Richard Purdum.

Jeffrey Katzenberg, presidente da companhia na época, não gostou nadinha do que viu em tela e nos storyboards, e decidiu que o melhor para o filme seria começar do zero, trocando todo seu quadro criativo, incluindo seu diretor. Seu primeiro impulso foi chamar os mesmos diretores de A Pequena Sereia, John Musker e Ron Clements, mas ambos recusaram, pois estavam exaustos após seu último projeto.

Abertura original:

“Com o passar dos anos ele caiu em desespero e perdeu toda a esperança. Pois quem seria capaz de amar um monstro?”

Narrador

Optaram, então, pelo plano B, convidar Gary Trousdale e Kirk Wise para dirigir a nova animação. Nem um dos dois possuía real experiência na área e por isso todo trabalho colaborativo com outros artistas foi ainda mais importante. Outra adição à equipe foi a roteirista Linda Woolverton, ela foi a primeira roteirista dos estúdios e A Bela e a Fera era sua animação de estreia. A adaptação de Woolverton, porém, não foi nada fácil.

Ela não sabia como o processo criativo funcionava e se irritava cada vez que os animadores alteravam suas cenas. O fato de ela querer escrever uma heroína diferente das feitas anteriormente, dificultava ainda mais sua relação com a equipe. Ela imaginava uma Bela leitora, que queria conhecer o mundo. Enquanto isso os animadores esboçavam uma cena de Bela cozinhando um belo bolo para seu pai. Linda teve que ser muito teimosa para manter sua visão única de como uma princesa Disney deveria ser nos anos 1990.

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Mas ela não lutou sozinha. Ao seu lado, estava Howard Ashman. Ashman e Alan Menken deram um novo sopro de vida às produções Disney após comporem para A Pequena Sereia. Ambos sabiam como utilizar a música para melhor contar uma história, sabiam que cada personagem deveria cantar quando palavras não fossem suficientes.

Com o tempo, e após muito trabalho e brigas, Linda percebeu como os animadores poderiam dar mais vida ao seu texto e personagens. E os artistas entenderam o porquê precisavam de Woolverton e sua originalidade. Todos esses problemas ao longo da produção não fizeram o prazo de estreia mudar, o que significava que ao invés de três ou quatro anos para finalizar o longa, a equipe teria apenas dois. Todos os artistas tiveram que dar o seu máximo para terminar a tempo.

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“Essa garota é muito esquisita. O que será que há com ela? Sonhadora criatura, tem mania de leitura. É um enigma para nós a nossa Bela.”

“Bela”

Vamos, finalmente, dar play no filme? Se por um acaso nunca assistiu ao longa, insisto que pare de ler e faça-o. O tempo não apagou o brilho dessa animação. A partir de agora, o texto estará cheio de spoilers, pois irei comentar detalhadamente sobre a trama. Então, cuidado!

Houve muitas e muitas versões para o prólogo, incluindo uma que seria totalmente animada. Porém, os artistas escolheram ficar com os vitrais enquanto o narrador nos conta o que precisamos saber. A trilha sonora é de arrepiar, um dos trabalhos instrumentais mais belos de Menken. Em poucos minutos, temos uma boa compreensão do contexto de nossa história. Sabemos que um príncipe arrogante e mimado fora castigado e enfeitiçado por uma feiticeira, e seu encantamento seria quebrado apenas quando aprendesse a amar e fosse amado de volta.

Abertura de A Bela e a Fera:

Porém, há poucos detalhes. Não sabemos o porquê a feiticeira anda por aí enfeitiçando pessoas. Ou por que a vila, que veremos em breve, não se lembra de seu monarca. Não são necessariamente furos, mas informações que gostaríamos de ter. Não há muito tempo para pensar nisso, já que, em seguida, temos a apresentação de Bela através de uma canção que é também o primeiro número musical do filme: “Belle“.

A sequência foi a primeira escrita por Ashman e Menken, que não sabiam se os diretores iriam querer começar seu filme com uma canção tão longa. E ainda bem que deixaram! Ao vermos nossa aventura começar assim, sabemos logo que estamos prestes a ver um ótimo musical. Durante a música conhecemos a personalidade de Bela e seu desejo por livros e aventuras. Percebemos que ela é considerada estranha na vila mesmo sendo tão admirada por sua beleza. Seu modo diferente de ser foi destacado pela cor de sua roupa: ela é a única que usa azul em sua aldeia.

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“Não é direito uma mulher ler. Logo começa a ter ideias, a pensar…”

Gaston

Conhecemos também Gaston, um personagem que deveria refletir beleza, mas cuja personalidade logo percebemos pertencer a um vilão. Andreas Deja estreia animando seu primeiro vilão icônico. Deja será conhecido por animar mais vilões futuramente, pois Gaston é seguido de Jafar e Scar. Seu design, com músculos enormes e queixo saliente, faz com que ele mais pareça uma caricatura de alguém que deveria ser bonito.

Sua aparência é uma sacada genial: se Fera será feio com um bela personalidade, seu vilão será um negativo de si. Será belo em seu exterior com uma horrível personalidade. Ele não possui garras afiadas, rugas, dentes pontudos ou tentáculos. Não. Gaston traz um novo tipo de ameaça. Ele traz o machismo, a vaidade, a brutalidade. Ele é um vilão, infelizmente, atual. Ele não consegue receber não de uma garota.

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Bela segue para sua casa onde encontra seu pai. Não sabemos muito sobre Maurice, o porquê de ele ter se mudado para a vila ou o que aconteceu com a mãe de Bela. Tudo o que podemos perceber é o quanto a garota ama seu pai, o quanto ela se importa com ele. Na sequência, ele parte com Philip, seu cavalo, para uma feira de invenções. Essa versão do conto não possui o pedido icônico de Bela, que pede ao pai que traga apenas uma rosa como presente.

Maurice se perde na floresta quando já é noite. Assustado e perseguido por lobos, o cavalo dispara e deixa o pai de bela sozinho. Desesperado, ele corre e se depara com imensos portões, os quais abre sem pensar duas vezes. O castelo da Fera é sombrio e imponente. Ameaçador até. Mas Maurice logo é recepcionado por pequenos objetos encantados e acolhedores. Todos são extremamente carismáticos, mas Lumière se destaca. Ele claramente quer quebrar o feitiço.

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“Quero viver num mundo bem mais amplo, com coisas lindas para ver. E o que eu mais desejo ter, é alguém pra me entender. Tenho tantas coisas pra fazer…”

“Bela (Reprise)”

Animar esse objetos requereu muita sagacidade por parte dos animadores. Como um castiçal sem pernas poderia chutar? Como uma chaleira poderia andar e saltitar por aí sem se quebrar? A cada cena, nova soluções eram encontradas. Enquanto Madame Samovar, uma chaleira, e seu filho Zip, uma xícara, o apoiam, Horloge, um clássico relógio, teme o que o mestre de todos irá achar daquilo tudo. Na versão original, haveria também uma caixinha de música encantada mas sua função de ser adorável foi transferida para Zip.

Assim que Fera vê Maurice, ele enlouquece de raiva. Pensando que o inventor queria zombar da criatura, ela o prende em uma de suas masmorras. Eu invejo aqueles que tiveram a chance de assistir ao filme nos cinemas em 1991, pois puderam ter a chance de realmente temer a Fera antes de saber como a história acabaria.

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Saímos desse mundo escuro, voltamos à vila. E, para nossa surpresa, Gaston não apenas não aceita a falta de interesse de Bela, como pretende pedi-la em casamento. Ela o recusa, claro. O que só aumenta sua fúria. Ao ficar sozinha, Bela pode finalmente falar – ou cantar – sobre seus reais desejos. Ela quer viver aventuras, conhecer o mundo. A curiosidade é sua maior característica. Nessa tomada também podemos ver como as paisagens do interior da França influenciaram os artistas.

Philip chega e, ao vê-lo sem alguém montado, Bela percebe que há algo errado. Ela logo corre para o castelo e entra no castelo, sem pensar duas vezes, atrás de seu pai. Sem ser recepcionada por objetos mágicos, ela anda sem rumo até chegar às masmorras, onde seu pai já está com as mãos geladas. Não demora muito para Fera aparecer e Bela, então, toma uma das atitudes mais corajosas e altruístas do Universo Disney. Ao melhor estilo Mulan, ela troca de lugar com o pai. Com medo que ele adoeça, ela decide ficar em um castelo assustador com uma criatura terrível, para sempre.

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“Não há igual a Gaston, nem melhor que Gaston. Nem pescoço mais grosso que o seu, oh, Gaston.”

“Gaston”

Mark Henn faz um trabalho extraordinário nessa cena da masmorra, pois, literalmente, atua com o lápis. As expressões de Bela são belas e, ao mesmo tempo, tocantes. Fera não se comove com a coragem ou lágrimas da moça, mas aceita o acordo. Enquanto Fera a guia até o quarto, vemos estátuas assustadoras nas paredes do castelo, que nada mais são do que os primeiro conceitos de design do que seria a Fera. Ao chegar em seu quarto, nada resta a menina senão chorar de desespero por sua situação. Ela choraria muito mais frequentemente, porém Linda não queria sua heroína se lamentando todo o tempo.

Mais uma vez voltamos à vila, e nos deparamos com Gaston irritado em sua taberna. Seu amigo, Le Fou, mostra, então, o quanto admira o brutamontes ao cantar “Gaston“. Durante toda a letra, vemos como aquela aldeia admira Gaston por sua força física e habilidades na caça. Em hora nenhuma, mencionam sua inteligência ou personalidade.

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Quem acaba com a celebração de todos é Maurice, que chega gritando e falando sobre uma Fera terrível em um castelo. Ele precisa de ajuda para resgatar Bela, mas é claro que todos o consideram louco. Ao invés de se apiedar da situação do senhor, Gaston logo bola um plano para usar a possível demência de Maurice para chantagear Bela.

No castelo, bela finalmente conhece Madame Samovar e os outros objetos mágicos. Para a surpresa de todos, a moça decide que não irá jantar com a Fera, mesmo que tenha pedido delicadamente, ou o que julga ser delicado. Erroneamente, Fera acha que a moça o julga por sua aparência, quando ela verdadeiramente o julga por suas ações. Ela não irá simplesmente jantar com quem a fez prisioneira.

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“Espero que goste daqui. O castelo é sua casa agora. Pode ir aonde quiser. Menos a Ala Oeste. É proibida.”

Fera

Glen Keane fez um trabalho sublime criando a Fera. O animador resolveu pesquisar diversos animais, como gorilas, búfalos, lobos e javalis, e fez uma junção de todos. Sempre, porém, mantendo os olhos de humano, os quais fazem com que o personagem possa se expressar da melhor forma em momentos chaves. É interessante observar que Fera se movimenta como um animal, chegando a andar sobre quatro patas, no início do filme. Ele não sabe mais como se portar como um ser humano. Isso, bem como sua voz, irá mostrar sua evolução ao longo da animação.

No meio da noite, Bela sai do quarto em busca de comida e, logo, todos os objetos tentam agradá-la. Eles não podem contar a verdade sobre o feitiço, mas podem tentar fazê-la sentir-se melhor. O número musical que vem a seguir grita Broadway. Lumière, e toda a louça encantada, dança e canta enquanto Bela janta. O icônico número musical “Be Our Guest” foi planejado para ter Maurice como protagonista, mas ao perceber que a heroína tinha pouco tempo em tela, os animadores mudaram de ideia.

Be Our Guest” com Maurice:

Não há modo algum de tirar essa canção da cabeça. A cena é empolgante e de arrepiar quando vista ao vivo. É nessa canção também que temos um pequeno deslize dos roteiristas. Horloge e Lumière dão a entender que há dez anos estão sem utilidade. Isso quer dizer que a feiticeira enfeitiçou uma criança de onze anos?

Após o jantar, Bela decide que quer conhecer o castelo encantado. Lumière anima a moça ao contar que há uma biblioteca gigantesca no castelo mas nada é capaz de distrair a atenção da garota da existência da Ala Oeste. A curiosidade de Bela é mais forte do que os avisos da Fera.

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“E você devia aprender a controlar seus nervos.”

Bela

Ao subir, ela vê que a Ala nada mais é do que os aposentos da Fera, agora totalmente destruídos. Há espelhos quebrados, cortinas rasgadas e um pintura mutilada, restando apenas belos olhos azuis pintados. E, claro, a rosa encantada. O brilho da flor encanta Bela que quase encosta na rosa com as mãos. Fera surge, furiosa e, como um animal, bufa, rosna e urra, expulsando a garota do castelo.

Bela monta em Philip o mais rápido que pode e, mesmo em meio à tempestade, parte para a floresta. Os lobos que perseguiram seu pai mais uma vez surgem. Eles encurralam Bela que tenta sem sucesso afugentá-los. Fera, então, surge. Arrependido, ele a seguiu para garantir sua segurança. O personagem está mais animalesco do que nunca. Ele urra e luta com os lobos. Ele consegue vencer, mas não facilmente. Ao fim da luta, sem força, desaba na neve.

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E, então, temos o talento de Henn novamente em ação. Bela poderia ter deixado a Fera ao acaso, morrer de frio ou comida por lobos. Mas sua bondade, e gratidão, não permitem. Sua expressão é emocionante, vemos que é, então, que ela começa a ver Fera como um ser humano e deixa de ser uma prisioneira. De volta ao castelo, os dois começam a se entender. É a primeira vez que o príncipe vê a gratidão de alguém. Mais que isso, é a primeira vez que alguém o toca sem medo, mesmo sendo um monstro. Bela não o teme, ela agora quer entendê-lo.

O filme começa no outono, e agora temos neve sobre todo o jardim do castelo, o que indica que o tempo está passando. O sentimento entre Bela e Fera não surge do nada, não é amor à primeira vista como na maioria dos contos de fadas contados pela Disney até então. Não há beijo de amor que vá salvar Fera do dia para a noite. O sentimento precisa ser genuíno. Fera é primeiro a sentir que há algo de diferente entre os dois. Ele sente uma vontade nova, de agradar a alguém sem receber algo em troca. Então, temos uma das cenas mais belas, e delicadas, do filme.

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Fera: “Eu confesso que nunca senti isso por ninguém antes. Quero fazer algo por ela! Mas o quê?”

Horloge: “As coisas costumeiras: flores, chocolates, promessas que não pretende cumprir”

O príncipe decide entregar a Bela sua imensa e valiosa biblioteca. O cenário aqui é lindíssimo, e não por menos, Bela fica completamente encantada ao olhar ao seu redor. E mais encantado ainda fica Fera, ao ver o quão feliz deixou Bela. Ele consegue tocar Bela de um jeito que Gaston jamais conseguiria.

Em seguida vem sequência com várias cenas que mostram o cotidiano dos dois no castelo. Fera nem ao menos sabe como usar talheres. Mas Bela já não zomba, sua gentileza faz com que ela apenas se adapte e passe a tomar sopa também de outro jeito. É uma troca de gentilezas contínua entre os dois. Ah, e os olhos mais atentos devem ter notado um grande erro de continuidade na cena do jantar. Enquanto os dois tomam sopa, Fera aparece limpo, sujo, e limpo novamente sem nenhuma explicação.

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A canção seguinte é “Something There“. É uma música singela, mas que representa como os dois estão evoluindo quanto aos sentimentos que sentem um pelo outro. É uma canção também especial, pois teve o dedo de Ashman ainda mais presente, já que ele fez questão de indicar o tom certo para Paige O’Hara. Ao fim da música, temos uma Fera com movimentos extremamente humanos. Sua voz não rosna e ela passa a usar roupas.

Em versões do filme lançadas posteriormente, há uma cena extra aqui, na qual os objetos cantam “Human Again” e os vemos limpando o salão de festas do castelo. Particularmente, não gosto dessa adição. Ela quebra todo o ritmo do filme. Além disso, ao longo da cena vemos Bela ensinando Fera a ler e prefiro acreditar que Fera nunca desaprendeu a ler. Os livros eram, afinal, sua escapatória para o mundo exterior e um traço em comum entre os dois.

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Fera: “Eu reparei o seu olhar, e não tremeu quando chegou a me tocar. Não pode ser… que insensatez… jamais alguém me olhou assim alguma vez.”

Bela: “Como ele está mudado. Claro que ele está longe de ser o príncipe encantado, mas algum encanto ele tem, eu posso ver.”

Após dias aprendendo um com o outro, é hora do famoso baile. A cena é espetacular, além de ser uma aula de como usar computação gráfica para melhor contar uma história sem deixá-lo distrair a platéia. Cenários foram criado no computador o que permitiu bons movimentos de câmera. Quem for ao Walt Disney World não deve perder a chance de ir ao restaurante Be Our Guest, uma réplica do salão do castelo.

Fera, veste azul, assim como Bela fez no início do filme, mostrando sua bondade. Vê-lo sem graça enquanto Bela o ensina a dançar é mais do que adorável. E quando vemos ela apoiar a cabeça na Fera, mostrando o quão confortável está com ele, é quase impossível não abrirmos um imenso sorriso. No entanto, presentes, danças e jantares não provam o amor de ninguém. É após a dança que Fera prova seus sentimentos.

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Vendo a tristeza de Bela, ele deixa que ela veja seu pai no espelho mágico. Para o desespero da moça, Maurice está perdido em uma tempestade de neve e muito doente. Glen Keane, então, entra em ação com uma das cenas mais belas que já animou. Todo o momento podemos ver no rosto de Fera sua dor por saber que Bela sofre e por saber que provavelmente nunca mais irá vê-la, pois sabe que a deixará ir. Só o que pode fazer ao imaginar seu futuro solitário, é urrar como um animal ao vê-la partir.

Como se não bastasse a dor de vê-la partir, os objetos encantados perdem o pouco de esperança que tinham de ver o feitiço se quebrar, já que Fera pode ter aprendido a amar, mas ainda não foi amado de volta. Bela encontra seu pai bem a tempo de salvá-lo. Ela o leva até sua casa mas seu alívio não dura muito tempo. Logo, o dono de um manicômio bate à porta para prender o inventor. E pior, toda a população apóia a internação forçada de Maurice, pois também o julgam maluco.

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“Eu a deixei partir. Tiver que deixar. Porque eu a amo.”

Fera

Tudo não passa de um plano de Gaston, claro. Ele se oferece para tentar resolver esse mal entendido, caso a garota se case com ele. Ela, mais uma vez o recusa e em uma tentativa desesperada de provar a sanidade do pai, mostra Fera no espelho mágico que levou consigo para toda a aldeia. Ela tenta se redimir, dizendo que a Fera é, na verdade, gentil, mas é tarde demais. Gaston já se irritou com os sentimentos da garota para com a Fera e todos da aldeia temem a criatura.

O último grande número musical acontece. Gaston, empunhando uma tocha, lidera todos da aldeia até o castelo enquanto cantam “The Mob Song“. Eles tem uma intenção clara: matar a Fera. E Bela nada pode fazer pois está presa com seu pai. Os objetos se mobilizam para defender o castelo mas Fera… Ah, Fera não tem a menor vontade de se defender. Não há razão para tentar sobreviver. Lumière e os outros afugentam os homens da vila enquanto, ao longe, Zip ajuda Bela e seu pai a fugir.

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O grande embate será entre Fera e Gaston, mas só uma pessoa conseguiria fazer Fera ter vontade de lutar. Chegaria Bela a tempo? Gaston acerta Fera com flechas, o chuta e o lança através de janelas. Quando está prestes a dar o golpe final, Bela se aproxima do castelo e a situação se inverte. Ver que a moça voltou faz com que o príncipe enfeitiçado arranje forças para revidar.

Os dois continuam seu combate sobre os telhados até que Fera consegue colocar a mão ao redor do pescoço de Gaston e o segura pendurado. É sua chance de matar o caçador, basta soltá-lo. Mas ele não é mais uma Fera. Sua expressão de crueldade se desmonta enquanto ele escolhe poupar a vida de Gaston. Sua jornada terminou. E Bela veio salvá-lo! Enquanto os dois trocam olhares apaixonados, Gaston aproveita para esfaquear Fera. O vilão leva o mesmo fim que tantos outros vilões Disney, caindo para a morte.

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“Ele não é monstro, Gaston. Você é!”

Bela

Bela ajuda a Fera ferida a voltar para dentro do castelo e declara seu amor mas é tarde demais. Fera revira os olhos, morto, enquanto a última pétala cai. Mais uma vez invejo imensamente quem pode assistir a essa cena nos cinemas. Os animadores atuam com sutilezas como nunca. Sabemos que, por ser um filme Disney, o final será feliz mas… por um momento, podemos duvidar.

Quando tudo parece perdido, raios cintilantes começam a cair ao redor da Fera. Sua transformação começa, para a surpresa de Bela que não faz nem ideia da real identidade da Fera. Essa cena é uma das quais Glen Keane tem mais orgulho de ter feito, e não por menos. Ele estudou anatomia e a obra de grande escultores para criar o príncipe. Ver Bela reconhecendo o príncipe como o homem pelo qual se apaixonou através de seus olhos é maravilhoso.

Animação da transformação da Fera:

“Não–não! Por favor–por favor–por favor, não me deixe. Eu te amo.”

Bela

A sequência ficou tão boa, que a readaptação bebeu dela completamente. Mas nem todo o mérito deve ir para Keane, já que o artista de storyboard que planejou toda a cena foi Chris Sanders. O castelo volta a reluzir, monstros se tornam anjos e os objetos voltam a ser humanos. Tudo termina bem, como deve ser. Os dois dançam – uma animação reaproveitada de A Bela Adormecida (1959) – e vivem felizes para sempre. O filme fecha com um vitral dos dois, assim como abriu.

Quando criança, sempre assisti ao clássico animado em sua versão dublada. E devo dizer que enquanto adulta, nunca senti real vontade de assistir à sua versão original. Sei que as vozes são lindíssimas e os atores espetaculares, principalmente por virem direto dos palcos da Broadway, porém, além da nostalgia envolvida, acho fenomenal o trabalho de atuação feito por Garcia Jr. Seu nome já é conhecido por todos nós, pois participou de diversas produções como A Pequena Sereia (1989) e O Rei Leão (1994), mas poucos percebem que, nesse filme, ele atua como dois dos personagens principais: Fera e Gaston.

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O filme fez mais do que agradar a crítica, ele agradou a todos. Ao ponto de se tornar a terceira maior bilheteria de seu ano, e competir em diversos prêmios. Como já mencionado, o filme concorreu ao Oscar® de Melhor Filme, uma honra nunca dada a uma animação antes. Infelizmente, perdeu a estatueta para O Silêncio dos Inocentes (1991). No entanto, Alan Menken não saiu com as mão vazias. Ele havia sido indicado, com Ashman, três vezes por Melhor Canção Original.

“Beauty and the Beast” levou o prêmio e Menken foi receber a estatueta sem Howard. O letrista faleceu antes do filme ser finalizado, devido às complicações causadas pela AIDS, o que é um pesar imenso. Poucos perceberam, mas ele estava extremamente doente durante toda a produção. Quem recebeu a estatueta e discursou em seu lugar foi seu parceiro. Ashman também não pôde terminar seu trabalho em Aladdin (1992).

Beauty and the Beast“:

“Ao nosso amigo Howard, que deu a uma sereia a sua voz e a uma fera a sua alma. Seremos eternamente gratos.”

Dedicatória de A Bela e a Fera

A jornada de Ashman nos estúdios Disney foi curta, mas de um impacto tremendo. Ele trouxe aos estúdios um novo modo de contar histórias. É irônico, e triste, pensar que em 2017 pessoas queiram boicotar a nova versão porque um dos personagens, Le Fou, tem a mesma característica de quem devemos toda a magia da animação de 1991.

A animação foi remasterizada e modificada, voltando aos cinemas pelo menos duas vezes, sendo uma delas em três dimensões. O filme é tratado com muito cuidado pela Disney, que libera esporadicamente sua exibição em televisão aberta e a venda de seus DVDs. Também pudemos conhecer um pouco mais sobre a vida de Bela no castelo quando o filme A Bela e a Fera: O Natal Encantado (1997) foi lançado direto para o Home Vídeo.

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Como toda continuação Disney, a animação está longe de ser um primor. Mas também não é horrenda. Ela possui uma trilha sonora bacana e por se passar no período enquanto Bela mora no castelo, ela apenas acrescenta informações e não altera o que conhecemos. Vale a pena conferir no período das festas de fim de ano.

Quanto ao novo longa-metragem, não precisamos mencionar o tamanho do sucesso que está fazendo. Ele respeita o clássico e traz muitas respostas às pequenas pontas soltas do roteiro da animação – porém, continuamos sem saber o verdadeiro nome do príncipe que não, não é Adam, como a maioria dos fãs acredita. Acho que viveremos para sempre sem saber.

Evermore“:

Também trouxe músicas inéditas escritas por Menken e Tim Rice, como “Days in the Sun” e “Evermore“, o novo solo da Fera Uma curiosidade para aqueles que já assistiram à versão com atores: a fala de Bela no fim, quando ela sugere que Fera deixe uma barba crescer, havia sido uma ideia de Glen Keane que foi descartada. Ele também gostava mais da Fera em sua versão ‘animal’.

O estilo do musical animado é tão Broadway, que nada mais natural do que ele ganhar uma versão para os palcos. A peça ficou anos em cartaz, de 1994 a 2007, é o nono musical a ter ficado mais tempo em cartaz. Mesmo com crítica divididas, foi outro grande sucesso que rendeu a Menken e Woolverton ainda mais prêmios por seu trabalho. A peça trouxe várias músicas novas como a já mencionada “Human Again“, “A Change in Me” e “If I Can’t Love Her“, o primeiro solo da Fera.

If I Can’t Love Her“:

Não há como eu fingir que a A Bela e a Fera é apenas mais uma animação Disney e tratá-la sem ser tendenciosa. Para mim, ela sempre foi a melhor animação do estúdio. As canções são impecáveis, Menken e Ashman eram imbatíveis juntos. A animação mostra todo o poder de emocionar que um talentoso animador como Glen Keane tem em mãos, apenas com um lápis e papel. Seus desenhos são capazes de emocionar como qualquer ator real. Ou talvez ainda mais, já que conseguiu humanizar um monstro.

E o roteiro, apesar de simples, foi extremamente bem trabalhado. Desde o vilão, que vai contra tudo o que imaginávamos sobre vilões, até a heroína, que não mais quer fazer tortas ou se deixa encantar por um belo rosto. O filme continua intocável e quanto mais os anos passam, mais percebo como toda a trama faz sentido tanto para adultos quanto para crianças.

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Não julgar alguém por sua aparência talvez seja a lição mais óbvia de todo o filme. Porém, para mim, crescer vendo em Bela que não precisamos nos encaixar na multidão e que meninas podem, e devem ser inteligentes, sempre foi o melhor aprendizado.

E vocês, Camundongos? Gostam do filme tanto quanto eu? Comente com sua cena favorita ou o que mais gostou na animação. Mais alguém quer aquela biblioteca? Ah, e se querem saber mais sobre os bastidores do filme, temos várias matérias sobre os artistas envolvidos em sua produção como Glen Keane e Howard Ashman, além de um podcast entrevistando Garcia Jr.

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Escrito por Caroline

Designer Gráfico, Disney freak, viciada em café, quer ser roteirista e princesa quando crescer. Têm mais livros do que deveria e leu mais vezes “Orgulho e Preconceito” do que têm coragem de admitir.