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Clássicos na Crítica | Enrolados

Após algum tempo de “férias”, temos a volta das CNCs, dessa vez sobre um de meus filmes Disney preferidos. Em julho de 2011, escrevi o da Pequena Sereia, minha animação preferida. Em janeiro do ano passado, foi a vez de A Dama e o Vagabundo. Agora, comemorando o 2º aniversário do lançamento do filme nos cinemas brasileiros, que se deu em 07 de janeiro de 2011 (parece que foi ontem, né?), escrevo sobre essa animação que reinventou o gênero de contos-de-fada (além de ser o queridinho do Disney Mania, vamos combinar). Com vocês, Enrolados.

Enrolados é apresentado pela Walt Disney Pictures,  uma comédia de animação musical com muita ação sobre uma menina com mágicos cabelos dourados de mais de 21 metros de comprimento. Rapunzel, a princesa que foi raptada do castelo de seus pais quando bebê é mantida presa em uma torre e sonha com aventuras. Agora uma adolescente determinada e criativa, ela realiza uma fuga de arrepiar os cabelos com ajuda de um ousado bandido. Com o segredo de sua linhagem pesando na balança e seu captor em seu encalço, Rapunzel e seu amigo encontram aventura, emoção, humor e cabelos… muitos cabelos.

É um prato cheio comparar Enrolados ao legado da Disney junto aos fãs. São muitos os aspectos que abrem parênteses para compará-lo com o rico passado de 75 anos de animações do estúdio, ao qual Enrolados paga tributo a todo momento: roteiro, trilha sonora e personagens são apenas alguns dos quesitos nos quais o filme pegou elementos emprestados das produções anteriores. Apesar disso, a inovação pode ser sentida começando pela técnica do filme, que definitivamente foi o primeiro êxito real da Disney em CGI. É irresistível fazer uma comparação entre A Princesa e o Sapo (2009) e Enrolados (2010) – Ambos são filmes fantásticos, e o encanto de cada um está atrelado à sua técnica. A Princesa e o Sapo é lindo e elegante na sua animação à lapis, enquanto Enrolados é moderno e brilhante no seu uso do CGI.

Empecilhos e controvésias marcaram a produção desse filme. Ao longo dos 10 anos em que ficou em produção, o filme teve sua história reformulada diversas vezes e perdeu seu diretor original Glen Keane ao longo do processo. O resultado final, embora satisfatório, acabou custando à Disney $260 milhões de dólares, o que o torna o desenho animado mais caro que já passou pelos cinemas. De qualquer forma, o preço também está atrelado à perfeição de detalhes técnicos do filme, com destaque para os cenários externos, ricos em detalhes, e é claro, para o cabelo da Rapunzel, uma das realizações mais fantásticas da animação computadorizada.

Há muitas as inovações técnicas em Enrolados. É perceptível que todos os “cabelos” do filme ganharam uma ênfase especial. É notável que animar cabelos nunca foi uma preocupação dos estúdios, mas Enrolados, desde as madeixas negras/grisalhas de Gothel até os delicados fios de Flynn Rider dá uma ênfase a isso. A iluminação é perfeita e segue o clima de cada cena, o que pode ser percebido na torre da Rapunzel, que alterna entre momentos claros/iluminados, desde a sequência “When will my life begin” à luz do dia, até um tom cinza que toma de conta do ambiente no clímax. O design dos personagens, embora refrescante, conserva a tradição da Disney, voltando a Branca de Neve e os Sete Anões no sentido de apresentar uma vilã tão bela quanto a mocinha, coadjuvantes caricatos e um mocinho charmoso.

O elenco de personagens, no entanto, responde pela maior parte do sucesso do filme. Enrolados tem um dos castings mais interessantes e ricos dos filmes da Disney. Começando pela mocinha Rapunzel, que tinha tudo para ser chata e ingênua, tornou-se uma mistura de todas as princesas anteriores do estúdio. Possui a doçura e a simpatia das princesas clássicas (Branca de Neve, Cinderela e Aurora), ama os livros e não se importa com a aparência dos seus colegas “bandidos” como faria Bela, é determinada (não tanto quanto Pocahontas e Mulan, mas o suficiente para alguém que viveu isolada a vida toda) e inteligente como Tiana. A princesa com quem mais se parece é Ariel, sendo tão divertida e descontraída quanto a sereia, além de estar disposta a qualquer coisa para realizar seu sonho. Apesar de faltar a Rapunzel a inovação que o estúdio apresentou no ano anterior com Tiana, o resultado final definitivamente foi mais que satisfatório.

 

Já o mocinho Flynn Rider pode ter sido o melhor personagem masculino do estúdio desde sua criação. Desde Branca de Neve os “príncipes” eram um problema, porque ao mesmo tempo que precisavam ter a simpatia do público, não podiam tomar muito tempo da história, dedicada majoritariamente à princesa. O que eles procuravam fazer era alguém como Eric, de A Pequena Sereia: era suficientemente carismático e não tomava tempo significativo da protagonista. No entanto, Flynn foi muito além ao roubar em alguns momentos a cena da Rapunzel e divertir o público com sua personalidade inovadora e bastante sedutora para um príncipe da Disney.

Destaca-se também  Gothel, que  recupera elementos de outras vilãs do estúdio. Sua busca pela beleza incondicionalmente e suas mudanças físicias rementem à rainha de Branca de Neve e suas tiradas irônicas e sagazes lembram as de Úrsula. Sua relação com a mocinha, no entanto, é bastante inovadora, pois é perceptível que no fundo ela nutre algum sentimento pela menina que raptou. Ao mesmo tempo, a  dominação e a tortura psicológica que impõe à Rapunzel podem ser entendidas como algo ainda pior do que dar a alguém uma maçã envenenada.

 

 

Os coadjuvantes  também têm sua parcela de responsabilidade no sucesso do filme, principalmente considerando que a Disney errou feio a mão dos coadjuvantes de A Princesa e o Sapo no ano anterior: o crocodilo Louis e o vagalume Ray eram excessivamente infantis, falavam demais e tentavam inutilmente ofuscar a história dos protagonistas, apresentando sagas próprias (querer se tornar humano e o romance com Evangeline, respectivamente). Em Enrolados, os coadjuvantes estão integrados à história dos protagonistas e o fato de serem mudos, no caso de Maximus e Pascal, impediu que acabassem aborrecendo o público de alguma forma. A história dos brutamontes também foi uma ideia muito feliz, totalmente condizente com a proposta “descubra seu sonho” trazida pelo filme.

Iniciado a discussão sobre a trilha sonora, Enrolados perde alguns pontos se comparado a A Bela e a Fera e A Pequena Sereia. Não dá para comparar “Part of your world” com “When will my life begin” ou “Beauty and the Beast” com “I see the light”, mas digamos que dá pro gasto. Afinal, talvez nunca mais na história do cinema tenhamos músicas tão boas quanto as que eu citei. Além disso, o fato é que não há músicas ruins e a trilha provê momentos engraçados (“I’ve got a Dream”), dramáticos (como a reprise de “Mother knows best”) e românticos (“I see the light”), sempre remetendo a clássicos anteriores, principalmente no caso da última música, que faz uma bela referência a “Kiss the Girl”.

O roteiro do filme também não deixa a desejar – Ao contrário de A Princesa e o Sapo, cujo roteiro é instável e “trava” no segundo ato, Enrolados segue coeso até o fim. A história tem um dos melhores roteiros já criados para um desenho animado, apresentando a coesão de A Pequena Sereia e O Rei Leão, sem os problemas de lógica de Aladdin ou os conflitos temporais de A Bela e a Fera. Pessoalmente, só acho que a história demora um pouco a deslanchar, mas acredito que ainda foi a melhor forma de conduzi-la.

Acredito que Enrolados não fica devendo nada ao legado da Disney, e com certeza é o primeiro filme em CGI do estúdio que vai ficar para a posterioridade. Mas além de ser um clássico, Enrolados deve uma pequena parte de seu sucesso à inspiração tirada da Pixar: as cenas de ação e o humor inteligente e bem dosado não deixam dúvidas disso. O filme vai de cenas singelas como a música “Healing incantation” até a cena frenética de perseguição na barragem. Enfim, a melhor adição ao legado da Disney nos últimos anos.

 

 

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Escrito por Animaluco

Editor do Animatoons de 2008 a 2011; Autor convidado para especiais CNC do Disney Mania